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out 03 2012

ENSAIO SOBRE A SINGULAR

Pensando nos paradigmas que mais se destacam no mundo ocidental, somos levados a constatar que o arquétipo racionalista é preponderante. Ou seja, traduzir fenômenos usando a razão tornou-se uma variável de amplitude consolidada.

Entretanto, propomos uma visita por enunciados filosóficos de pensadores como Schopenhauer, Nietzsche, Kant e Sartre sobre a problemática que se apresenta. Nesse sentido, evidentemente pelo grau de complexidade inerente, lembramos a hermenêutica como recurso indispensável para contextualizarmos palavras e não deixamos de considerar situações imperativas para o desenho teórico que pretendemos levantar.

Nesse sentido, Fritz Nietzsche quando escreveu “O Nascimento da Tragédia” (1870), especificamente em “Sócrates e a Tragédia”, segundo Safranski (2012, p. 54) alerta para o uso exagerado da consciência que dessa forma diminui  a criatividade: Ironizando escreveu Nietzsche “ (…) tudo tem que ser consciente para ser bom”. Ainda segundo Safranski (op.cit), Sócrates é concebido por Nietzsche como um grande responsável por influenciar a cultura submetendo o ideário de religiosidade, intuição e arte às imposições da lógica, da razão e do cognicível cartesiano. Isto é, levando as pessoas a permitir que a racionalidade se imponha a outras percepções da existência como as emoções.

Reforçando este pensamento, Schopenhauer defendia a ‘vontade’ como maior representação do eu. Ou seja, não é a razão que fornece os recursos necessários para o sujeito elaborar suas representações (significados) da existência.

Assim, as noções objetivas emergem de uma subjetividade inconsciente na qual impulsos desordenados criam necessidades. Sendo assim, buscar sanar tais necessidades gera atitudes que nem sempre são explicadas racionalmente.

O conhecimento em geral, tanto o racional como o meramente intuitivo, […] foi destinado originalmente ao serviço da vontade, para a realização de seus próprios objetivos e, de tal modo, permanecer-lhe submetido de maneira quase absoluta em todas as circunstâncias. (SCHOPENHAUER apud SAFRANSKI, 2012, p.413)

De acordo com isto, Kant deixou na sua obra o legado imprescindível na filosofia de enunciar que o homem não conhece racionalmente a essência da existência. Logo, tal essência é incognoscível. Segundo Kant, só podemos conhecer o que produzimos, isto é, o fenômeno; enquanto que aquilo que não conseguimos compreender porque vai além da nossa capacidade racional, apenas intuímos. Portanto, não traduzimos racionalmente tais essências, chamadas por Kant de ‘noumenos’. Vejamos o que Yazbec, mestrando em filosofia da PUC/SP, estudando Kant destaca:

A realidade, tal como ela é, em sua essência (noumeno) é incognoscível, ou seja, não podemos conhecê-la. Contudo, eu posso conhecer o modo como ela me aparece (fenômeno), posto que o modo de seu aparecimento não dependerá só dela, mas de mim também. Portanto, jamais conhecemos as coisas em si (noumeno), mas somente tal como elas nos aparecem (fenômenos). (YAZBEK, 2012, ONLINE)

Diante disto, não querendo desfavorecer o uso da razão, mas apenas apontar para outras alternativas de percepção da vida também importantes, somos levados a concluir que a arte e a religião são campos de estudo que precisamos considerar de forma mais respeitosa.  Quando Boaventura de Sousa Santos propõe a “ecologia dos saberes” (2010) para traduzir melhor o mundo atual, começamos a conceber a resignificação da hierarquia dos saberes. Afinal, a hierarquia tão indispensável na categorização de uma pesquisa, existe para esclarecer e não para desqualificar.

Por fim, se o uso impositivo da razão é apresentada por uns como o único meio eficaz de conhecer o que existe, então se trata de uma tirania da lógica. Assim sendo, para toda e qualquer tirania e para  os que dela fazem método, deixo as palavras de Boétie (2009, p. 69) “ Certamente, o tirano nunca ama e nunca é amado.”

                   Almani Veras

 

REFERÊNCIAS.

 

-BOÉTIE, Étienne de La.  Discurso da Servidão Voluntária. Ed. Martin Claret, SP, 2009, 133p;

-SAFRANSKI, Rüdiger. Nietzsche, Biografia de uma Tragédia. Geração Editorial,São Paulo, 2012, 363p;

-SAFRANSKI, Rüdiger. Schopenhauer, E os Anos mais Selvagens da Filosofia. Geração Editorial, São Paulo, 2012, 683 p;

-SANTOS, Boaventura de Sousa.  Epistemologias do Sul. Cortez Ed. SP, 2010, 637p;

-YAZBEK, André Constantino. A possibilidade do Conhecimento em Kant:Fenômeno X Noumeno. PUC/SP. Disponível :www.paradigmas.com.br/parad07/paradp7.6.htm. Capturando em 07 de maio de 2012. Online.